Art. I - O BANDEIRANTE E O PADRE


A Primeira Missa no Brasil - Victor Meirelles - 1860

Era no século XVI. Dificultosamente operava-se o progresso. Barreiras de todos os tamanhos. Os índios, senhores do país, interceptavam-se as expedições bandeirantes, contrapondo-lhe  tenaz resistência. Era o direito de quem se vê agredido, gratuitamente. Dentro em breve, o fusilar das setas iria substituir-se pelo fragor das bombardas. Correria sangue, muito sangue. Os índios seriam vencidos.
Um povo se levanta, em nome da civilização, para expulsar, até ao extermínio, aqueles que foram os possuidores legítimos de fabulosos tesouros. O amarelo metal e as gemas preciosas atraíam avarentos, tamanhos em número que se fazia mister o concurso de um sacerdote para coibir-lhes os abusos, moderar-lhes a ambição desmedida e obrigá-los a viver mais cristãmente. E quantas privações não sofreu o missionário...! É um padre João de Aspilcuêta Navarro, contando sua viagem, no ano de 1555 (1): <<cincoeta vezes>> passamos os mesmos rios e as mesmas terras. E prossegue: <<Muitas noites dormíamos molhados... todos... estiveram quase à morte... sem ter outra medicina que sangrar-se de pé... sem ter outro mantimento às mais das vezes que farinha e agua>>. <<... vi cousas que fiquei espantado>>, diz aquele sacerdote em sua viagem de 150 léguas, junto dos índios tapúias. É um Anchieta, e tantos outros, afanosamente zelando para a manutenção dos princípios religiosos.
Em terras mineiras, quantas vezes não sucedeu aquilo que nos conta o visconde de Chateaubriand, em sua viagem à bacia do Mississipe, o Meschacebé dos natches!: <<Ato contínuo, revestiu-se o divino sacerdote de uma túnica branca de casca de amoreira; tiraram-se os vasos sagrados do tabernáculo ao pé da Cruz; preparou-se o altar sobre um bloco de rocha; apanhou-se água na torrente vizinha e um cacho de uva silvestre forneceu vinho do sacrifício. Colocamo-nos todos de joelho na relva e principiou o mistério. A aurora, despontando atrás das montanhas, inflamava o oriente. Era tudo ouro e rosa na solidão. Enfim, de um abismo de luz surgiu o astro anunciado por tanto esplendor, e seuprimeiro raio incindiu sobre a hóstia consagrada que, nesse momento mesmo, o padre alçava ao ar. Ó sortilégio de religião! ó magnificência do cristianismo! Por sacrficador um velho eremita; por altar um rochedo; o deserto por igreja; por assistência inocentes selvagens! Não, não duvido qeu, naquele momento em que nos ajoelhamos, o grande mistério se cumpriu e Deus baixou à terra porque o sentí descer em meu coração". (2).
leitor amigo, curva tua fronte, talvez veneranda em anos e trabalhos, e adora, no silêncio da meditação, o Deus verdadeiro. Aquele que dobrou o ânimo de Clodoveu, o rei pagão, ao ser-lhe administrado o sacramento do batismo e do Crisma, no Natal do ano de 496 (3). Nada mas fazes do que seguir o exemplo de teus antepassados, daqueles que te geraram para Deus e para a pátria, tendo-nos deixado a religião como ponto culminante de nossas aspirações. Do contrário, a natureza protestará por ti, quando chamar em auxílio a terra e o mar, as estrelas e os ribeiros, as grutas e as cavernas, testemunhas de tanto sofrimento do passado.
<<A mata virgem desgrenhada aos ventos,
Eleva à noite a alma complexa e vária;
Do musgo humilde às grimpas de araucária
Ha, talvez, gritos, ha, talvez, lamentos" (4)

_____________
(1)-fasc. III e IV da Rev. do Arch. Publ. Mineiro, de 1901, pág. 1.159
(2)-Átala
(3)- Gregório de Tours, Hist. Frac. II, 31.
(4)- Alberto de Oliveira.



Esta é a primeira parte de sete que trago do PRIMEIRO CAPÍTULO, publicado no 7 Anuário da Diocese da Campanha, página 10 e 11.

Fonte:
LEFORT, Mons. José do Patrocínio. Anuário da Diocese da Campanha. Ed.7. Campanha, 1946.
Imagem: 
http://www.newsrondonia.com.br/noticias/historia+e+arte+na+chegada+dos+portugueses+ao+brasil/44265

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